Os amantes tomam o desjejum na manhã seguinte:
- Então estamos bem? – Pergunta Afonso sorrindo.
- Sim, estamos.
- Por mais que nos desentendamos, vejo que vamos viver a vida inteira juntos. Vai ser patético: nós dois velhinhos, um suportando e amando o outro – Afonso gargalha e busca a cumplicidade cômica do parceiro e tudo o que encontra é uma cara de poucos amigos.
- O que foi, Heitor? Que foi agora?
Heitor come uma fatia de queijo e diz:
- Precisamos conversar...
- Não gosto quando você inicia uma conversa com esse tom e com essa expressão.
- Não é justo.
- O que não é justo?
- Você quer viver comigo até envelhecermos. Não é o que eu quero.
- Como?!
- O que você quer não é o mesmo que eu quero...
- Você está com alguém?
- Já vem você, que alguém coisa nenhuma.
- Quem é ele?
- Não existe ele.
- Quem é ela?
- Tampouco ela. Existe apenas eu e eu desejo me relacionar com outras pessoas. Está fora dos meus planos ficar contigo até o fim dos meus dias, entendeu? Não é justo conosco continuarmos juntos, já que somos tão diferentes e temos expectativas tão dispares.
Afonso enxuga os olhos.
- Por que depois de a gente ter tido uma noite como a de ontem estamos nesse momento tendo esse tipo de papo?
- Porque são momentos distintos e só instantes deliciosos na cama não sustentam uma relação em que um vai numa direção e o outro vai noutra.
- Isso significa quê...?
- Entenda. Dói demais para mim isso, mas chegamos a um ponto em que não dá mais.
- Isso significa quê...?
- Quero me separar de você.
Afonso estanca. O choro estanca. A alma estanca. O corpo estanca.
- É isso mesmo o que você quer?
- É isso mesmo – Heitor começa a chorar. – Vou arrumar minhas coisas e vou deixar essa casa.
- Se você passar por aquela porta com seus pertences, não haverá mais volta.
- Não haverá mais volta.
O choque torna Afonso frio. Heitor está totalmente transtornado. Afonso se levanta, vai ao quarto, se arruma e vai trabalhar sem se despedir do que fica, Heitor cai em prantos, perde o apetite e começa a retirar as coisas da mesa.
Afonso entra no carro e liga o som. Ouve o familiar Cd de Carmina Burana. Dá a partida.
Heitor começa a lavar a louça.
Mais tarde está de partida, com seus pertences arrumados em três malas imensas. Olha a sala, lembra-se de cenas vividas nesse apartamento e sai.
Passando pela portaria, deixa as chaves com o porteiro:
- Boa viagem, Sr, Heitor.
- Obrigado, Matias.
Essa não tem volta!
Com a ajuda do zelador, ele põe as malas no carro e vai embora.
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